Guilherme Guinle e suas doações numismáticas

Em 1939, foi instituído pelo Decreto Lei 1.706 de 27 de outubro de 1939, O LIVRO DO MÉRITO, cuja função era de inscrever para a posteridade, nomes de pessoas que fizeram a diferença, por suas “doações valiosas”, ou ainda, pela reconhecida prestação de serviços relevantes e que houvessem com notoriedade, contribuído para o enriquecimento do patrimônio material ou espiritual da Nação, e merecido assim, o testemunho público do seu reconhecimento. Para isto, se prestavam com homenagens, a inscrição de grandes nomes, no Livro do Mérito.

Este mesmo Decreto Lei, foi depois, regulamentado pelo Decreto 5.244 de 07 de janeiro de 1940. O parecer da primeira indicação, data de 26 de setembro de 1941, demonstrando que a Comissão agiu com extremo cuidado, não tendo pressa em apresentar nomes. Enquanto existiu o LIVRO DO MÉRITO, não chegou sequer, a duas dezenas de nomes homenageados por seus préstimos de alto grau de reconhecimento ao País. Mas, alguns nomes de alguns cientistas, como Cardoso Fontes, e Vital Brasil, juristas como Clóvis Beviláqua e Francisco Mendes Pimentel, o sertanista, General Cândido Mariano Rondon e pessoas dedicadas à assistência social, como, Rafael Levi de Miranda e Sinhá Junqueira, ficaram inscritos.



Mas, entretanto, o primeiro nome inscrito neste Livro, foi o de Guilherme Guinle. O decreto da primeira inscrição, assinado pelo então Presidente Getúlio Vargas, estava assim redigido:

“Considerando que o Decreto-Lei de 1.706, de 1939, instituiu o Livro do Mérito, destinado a receber a inscrição dos nomes das pessoas que, por doações valiosas ou pela desinteressada proteção de serviços relevantes, hajam cooperado notoriamente para o enriquecimento do patrimônio material ou espiritual da Nação e merecido o testemunho público do seu reconhecimento; considerando que o engenheiro GUILHERME GUINLE, conforme parecer da comissão do Livro do Mérito, é merecedor dessa alta distinção, resolve: Mandar inscrever o seu nome no livro do Mérito.”

O diploma, executado em litografia, desenhado por J. Wast Rodrigues, noticia a imprensa da época, achava-se encerrado em artística caixa de jacarandá entalhado, com ornatos em prata cinzelada e seus dizeres eram os seguintes: ” O Presidente da República, tendo em alto apreço os merecimentos do Sr. Dr. Guilherme Guinle, em testemunho público do reconhecimento nacional pelas doações valiosas e prestação de serviços relevantes para o enriquecimento do patrimônio material e espiritual do Brasil, mandou fosse feita sua inscrição no Livro do Mérito.”

Mas, afinal, o que fez de grandioso este grande brasileiro, para entrar no Livro do Mérito e ainda, como o primeiro nome inscrito neste mesmo livro com tamanha distinção e honra?. Vamos ressaltar somente os registros das doações NUMISMÁTICAS, pois além de doações de hospitais, obras de artes, dinheiro para instituições de caridade, e outras coisas mil, ficaremos dias para relacionar a importância deste brasileiro exemplar, além de numismata e grande filatelista que foi em sua época.

Só para lembrar, nasceu em 1882 e faleceu em 1960. Foi presidente da CSN – Companhia Siderúrgica Nacional, foi presidente da Companhia Docas de Santos, foi fundador da Usina de Volta Redonda, foi o Presidente da Fundação Gaffrée e Guinle e de foi em foi, também ficaria horas para relacionar tudo isto. Vamos nos ater somente na parte Numismática.

O prazer que este grande homem tinha em fazer suas coleções, não se encerrava em si próprio, não era apenas pessoal e egoísta, pois, com o mesmo gosto que adquiria suas peças numismáticas, e diga-se de passagem, peças raras e algumas extremamente raras e ao final de sua catalogação, ele se satisfazia, ainda mais, ao transferir por doação ao patrimônio público nacional para que servisse para a educação do povo.

Em 1921, fez sua primeira doação a Secção de Numismática da Biblioteca Nacional. Nas anotações do primeiro livro de registro de moedas, verifica-se que se compunha de 147 moedas portuguesas, que vão do reinado de D. Sancho II ( 1223-1248) a D. Manuel II (1908-1910), sendo 128 de prata e as demais de níquel, cobre e de outras ligas de metais. As referidas moedas se distribuem pelos seguintes reinados: D. Sancho ( 1223-1248); D. Fernando ( 1367-1838); D. João II ( 1481-1495); D. Manuel I (1495-1521), D.João III ( 1521-1557); D.Sebastião ( 1557-1578); D. Filipe II ( 1598-1621); D.João V ( 1640-1656); D. Afonso VI ( 1656-1683); D.Pedro II ( 1683-1706); D.João V ( 1706-1750); D. José ( 1750-1777); D. Maria I ( 1786-1799), D. Maria II ( 1834-1853), D. Luiz I ( 1867-1889); D. Carlos ( 1889-1908) e D. Manuel II ( 1908-1910).

Da coleção constavam, ainda, duas moedas da África Portuguesa: dois macutos de D. José I – 1762 e uma pataca de Moçambique. D. Maria II, octogonal, e seis moedas da Índia Portuguesa, sendo uma rúpia de D. Maria I ( cobre), cinco bazarucos de D. João V ( 1722) e cinco bazarucos de D. João V, sem data, ambos de calaim.

Em 06 de abril de 1922, foi incorporada à seção de numismática da Biblioteca, nova doação de Guilherme Guinle, constando as seguintes moedas de ouro: moedas francesas – franco a pé, de Carlos V ( 1364-1380), um agnelo de Carlos VI ( 1380-1422), um escudo com o sol, de Francisco I ( 1515-1547), uma moeda do Condado de Flandres, real de dupla águia e uma moeda do Ducado da Toscana, sequim florentino, de prata.

Quatro dias depois, registra-se, com todos os detalhes, outra grande doação de Guilherme Guinle, constante de 720 peças do Brasil- Colônia e do Brasil-Império, sendo 123 de prata e 597 de cobre. Tais moedas vão desde o reinado de D. Pedro II ( 1683-1706) até D. João VI ( as do Brasil-Colônia), as do Brasil-Império, abrangem os reinados de Pedro I e Pedro II, até o final da monarquia do Brasil.

Já no Governo de Epitácio Pessoa, em 1922, criou-se o Museu Histórico Nacional, que se instalou a 12 de outubro no antigo Arsenal da Guerra. A seção de numismática, até então na Biblioteca Nacional, transferiu-se à nova instituição e as doações de Guilherme Guinle prosseguiram com a mesma e constante generosidade.

Em 02 de outubro de 1924, foi doado um conjunto de condecorações composto de 119 peças em ouro, prata dourada, esmalte e pedras preciosas, algumas das quais raríssimas.



Já em 1925, seu gesto de dadivosidade alcança o máximo, colocou sua riquíssima coleção à disposição dos técnicos do Museu Histórico Nacional para que dela retirassem todas as peças que lhes interessassem, de que resultou a inclusão de 2.310 exemplares, na maioria de ouro, além de muitas barras do mesmo metal, procedentes de diversas Casas de Fundição do Brasil, que, como se sabe, circularam como moeda no tráfico comercial no período colonial.

Ainda mais: ofereceu o mobiliário de imbuia para a sala de exposição das moedas brasileiras, que recebeu seu nome. O batismo foi procedido de correspondência entre o diretor do Museu, Gustavo Barroso, e o Ministro da Justiça, Afonso Pena Junior, No seu ofício, Gustavo Barroso diz que, entre outros doadores, Guilherme Guinle se tornou, desde a fundação do Museu, “seu incansável protetor, tendo lhe ofertado grande quantidade de objetos preciosos e uma rica coleção de condecorações e, agora, acaba de doar uma grande sala ricamente mobiliada e atapetada para a exposição das peças da numismática brasileira e todas as peças de ouro, prata e cobre que faltavam para completar a coleção”. A fim de demonstrar gratidão a tão generoso doador, resolvera denominar “Guilherme Guinle” a referida dependência.

Não cessaram, porém, as contribuições do presidente da Docas de Santos. No dia 06 de setembro de 1943, ofertou ao Museu, nova coleção, agora, de medalhas esportivas, sendo: regatas, tiro ao alvo, ciclismo, futebol, water pólo, hipismo frontão, ginástica, luta romana, corrida a pé, marcha, xadrex, e ainda, medalhas maçônicas, somando ao todo 492 peças. Na mesma data, foram doadas: 368 medalhas de instrução, 844 medalhas religiosas e devocionais, 281 medalhas com emblemas de associações religiosas e comemorativas estrangeiras e papalinas, medalhas portuguesas (religiosas), italianas, francesas, alemãs, espanholas, gregas. E mais, 41 jetons do Brasil e 9 jetons estrangeiros, 138 reclames monetiformes, 35 distintivos diversos, 100 distintivos estrangeiros e 210 medalhas dos seguintes países: França (54), Inglaterra ( 19), Holanda (1), Bélgica (14), Espanha (14), Áustria (13), Suíça (1), Alemanha (10), Itália (12), Rússia (6), Suécia (12), Prússia (12), Portugal (4), Papado (9), Estados Unidos (12), México (1), Chile (3), Argentina (5), Brasil (18) e preconícios do Brasil (10).

No mesmo ano de 1943, conforme ainda anotações no Livro de Registro, chega ao Museu outra doação abrangendo 1.036 peças, compreendendo medalhas comemorativas, devocionais, de instrução, de exposições, insígnias de ordens honoríficas, medalhas maçônicas, medalhas comemorativas do México, Estados Unidos, Alemanha, Bélgica, Espanha, França, Holanda, Inglaterra, Itália, Vaticano, Suíça, Cruz Vermelha da Suíça, Insígnias da Ordem Constantina de S. Jorge, da Ordem da Cruz de Ferro da Alemanha e da Legião de Honra da França.

Em 1944, registrou-se, ainda, novas doações de medalhas compostas de 46 peças. Ainda no mesmo ano, na página 260, as seguintes doações do grande benfeitor do Museu: medalha e estojo do Duque de Wellington, medalha da Ordem do Templários, sob o grão-mestrado do Palaport; medalhas espanholas de D. Carlos I e D. Felipe II; medalha da campanha South Africa; medalha da batalha do Marne; medalha do mérito do Internato Coração de Maria; medalha do Ano Santo ( 1935-1936).

As doações de peças históricas se iniciaram em 1924, e além das peças numismáticas, foram doadas peças de cerâmica, armaria, iconografia, mobiliário, vidraria, prataria, montaria, insígnias, indumentária e arquitetura.

Houve, ainda, doações a outros Museus, como o Museu Imperial de Petrópolis, Museu de Arte de São Paulo e doação inclusive, para a Academia Brasileira de Letras, neste caso, de um exemplar da edição “Princips” de Os Lusíadas. Houve, ainda, uma doação do retrato de Aleijadinho ao Arquivo Público Mineiro.

Fonte:
Texto escrito pelo colega João Gualberto Abibonds, para citar esse texto use o seguinte exemplo:
Abibonds, João Guarlberto. Guilherme Guinle – O maior doador da Numismática. Abibonds Numismática & Scripophilia, 2008. Disponível em: <http://abibonds.blogspot.com.br/2008/11/guilherme-guinle-maior-doador.html>. Acesso em 04 Mai. 2018.



André Luiz Padilha

Graduado em direito com especialidade em meios alternativos de soluções de conflito e atualmente é estudante de História. Colecionador de moedas desde 1997 e numismata desde 2011. É um ativo divulgador da numismática nacional publicando diversos artigos e estudos por dezenas de plataformas, presta serviços como avaliador e consultor em pelo menos 9 países, também é o fundador da Numismática Castro, do CNERJ e do canal Café e Numismática. É sócio da American Numismatic Association (ANA)

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